A qualificação técnica e pessoal é imprescindível para o empreendedorismo, principalmente no meio rural. Mais do que portar uma extensa bagagem de conhecimentos, é preciso saber a melhor forma de aplicá-los ou, até mesmo, se realmente vale a pena seguir com uma ideia. Em 2017, a produtora de leite Elizandra Kulckamp Jackes, do município de Marquinho, na região Centro-Sul do Paraná, encontrou no Programa Empreendedor Rural (PER), desenvolvido pelo Sistema FAEP/SENAR-PR, Sebrae-PR e Fetaep, as respostas que procurava para o seu negócio.
No início, a proposta era a implantação de pastagens para o gado leiteiro. Porém, no decorrer do curso, Elizandra entendeu que sua principal falha estava no manejo. “Eu fazia tudo do jeito que aprendi com meus pais, sem nunca pensar em fazer diferente. O PER abriu minha visão e comecei a enxergar onde estava errando”, revela a produtora, que começou na atividade em 2003.
O foco do projeto, então, tornou-se manejo, melhoramento genético e qualidade do leite. Para conseguir a qualificação técnica necessária, Elizandra participou dos cursos “Manejo de Bovino de Leite” e “Inseminação Artificial”, ambos ofertados pelo SENAR-PR. Paralelamente, foi convidada para integrar um projeto do Instituto Emater, chamado “Leite Competitivo Sul”, quando passou a receber assistência técnica na propriedade. Ao combinar este suporte com a qualificação e competência obtidos por meio do PER e das capacitações do SENAR-PR, Elizandra viu a transformação acontecer.
Em pouco mais de um ano, a produção média por animal saltou de 9 litros/dia para 15 litros/dia. Para chegar neste resultado, a principal atitude de Elizandra foi aplicar as mudanças que estavam ao seu alcance logo no início dos cursos. Com a assistência técnica, a atividade decolou. A infraestrutura também recebeu investimentos, o que contribuiu significativamente para a melhoria da produtividade. Agora, a propriedade de cerca de 15 hectares conta com um espaço de 108 m² para agrupar os 12 animais, sendo 10 vacas em lactação e duas novilhas, além de novas salas para ordenha, resfriador e medicamentos.
“Antes, os animais ficavam a céu aberto, eu fazia os cochos com pneu, espalhava os piquetes no pasto e colocava silagem. Às vezes, eu acabava de colocar a silagem, chovia, molhava tudo, as vacas não comiam e era jogado fora. Sem falar que elas acabavam mexendo e muita silagem era perdida”, relembra a produtora. “Também tinha problema com as vacas dominantes, que comiam mais rápido. Então, eu não conseguia tratar uniformemente todas as vacas”, complementa.
Bem-estar animal
Em relação ao manejo do gado, segundo a produtora, as mudanças não apenas aumentaram a produtividade, mas também reduziram perdas e facilitaram o trabalho no dia a dia. Para as bezerras, por exemplo, foi implementado o sistema de criação em casinhas, favorecendo o bem-estar animal e atendendo às condições básicas para o alojamento eficiente. Por meio da inseminação artificial, Elizandra melhorou o controle reprodutivo e passou a criar as próprias novilhas, que serão as futuras matrizes da propriedade.
Segundo a extensionista Milena Mateus, que acompanha Elizandra no projeto de assistência técnica do Instituto Emater, a iniciativa da produtora é o diferencial de seu sucesso. “No início do atendimento, começamos a trabalhar o processo de criação das fêmeas de reposição, adubação de pastagens e manejo do rebanho. Em conjunto, a Elizandra sempre busca aprimorar o conhecimento, participando de cursos e palestras. Ela é muito competente e comprometida com os resultados da propriedade”, afirma Milena.
Qualidade do leite
Durante o curso “Manejo de Bovino de Leite” do SENAR-PR, por meio de um colega de turma, Elizandra conheceu outro projeto de assistência técnica, com a empresa Laticínio Piloto, que tem a proposta de instruir produtores sobre procedimentos para a melhoria da qualidade do leite. Com mais esse suporte, a produtora identificou as práticas de sanidade animal que poderia implementar na sua atividade, além de passar a trabalhar com aspectos técnicos de qualidade do leite, como as análises mensais dos animais e do leite no tanque.
“A melhoria da produtividade foi de 50% a 60%. Com o controle de CCS [Contagem de Células Somáticas], por exemplo, eu tenho basicamente descarte zero de leite. Quando a taxa de CCS diminui, as vacas aumentam a produtividade. Com sanidade e bem-estar, deixo de gastar com antibiótico e medicação. Não tem mais perda por estresse do animal”, destaca Elizandra.
Com as mudanças no manejo e sanidade, o leite da produção de Elizandra chegou a atingir valores de 9 mil em Contagem Padrão de Placas (CPP) e 2 mil em CCS. Para termos de comparação, o limite tolerável pelo Ministério da Agricultura é de 300 mil de CPP e 500 mil de CCS. Agora que possui uma nova sala de ordenha com mais infraestrutura, a produtora espera que os números melhorem ainda mais.
“Ver o leite pela aparência é uma coisa. Mas fazer uma análise é totalmente diferente. Após o curso, fui implementando o que aprendi, como pré e pós-dipping, secagem correta das vacas, e a partir das análises, fui identificando onde estavam os erros, como manutenção de equipamentos, produtos utilizados, ambiente onde as vacas dormiam”, elenca a produtora.
Quando questionada sobre os planos para o futuro, Elizandra quer construir um escritório para trabalhar no planejamento da propriedade e receber os técnicos. Em relação à atividade leiteira, quer direcionar o foco para o melhoramento genético. “Eu me vejo aumentando a minha produção e, talvez, até entrando para a venda de matrizes registradas. Quem sabe nos próximos anos não chego entre os melhores com vacas de alta produção”, almeja.
Para a produtora, planejamento e parceria foram essenciais para o projeto dar certo e estar em prática com viabilidade e rentabilidade. “Eu costumo dizer que sempre é possível aprender alguma coisa diferente. Não adianta fazer vários cursos, ir em palestras e chegar na propriedade e não aplicar pelo menos uma pequena coisa daquilo que ouviu. É o que eu tenho feito”, finaliza.