A batalha judicial de cerca de 1,1 mil agricultores para receber uma dívida que passa dos R$ 80 milhões da Seara Indústria e Comércio de Produtos Agropecuários, em Sertanópolis, no Norte do Paraná, entrou no seu quarto ano. Em 2017, produtores rurais da região venderam suas respectivas produções de soja do ciclo 2016/17 à companhia. Na hora de receber o dinheiro referente à venda, a Seara entrou em processo de recuperação judicial. Desde então se arrastam os trâmites jurídicos que ainda não resultaram em dinheiro no bolso dos agricultores.
O produtor rural e presidente do Sindicato Rural de Santa Mariana, Anselmo José Bernardelli, relata que os últimos quatro anos foram tempos difíceis, pois ele tem 6,4 mil sacas de soja para receber. “Consegui negociar as dívidas no banco em quatro parcelas anuais, terminei de pagar nesse ano. Foram vários produtores na região que tiveram que fazer o mesmo. Nesses últimos anos, conseguimos produzir e honrar as dívidas, mas ficou esse dinheiro para trás. Agora, com a seca que estamos enfrentando, está fazendo mais falta do que nunca”, relata o agricultor.
Assim como Bernardelli, há produtores de toda a região na mesma situação, que precisaram renegociar dívidas. Os municípios mais afetados são Abatiá, Alvorada do Sul, Assaí, JUSTIÇA Bela Vista do Paraíso, Cambé, Ibiporã, Londrina, Nova América da Colina, Primeiro de Maio, Ribeirão do Pinhal, Santa Mariana, São Jerônimo da Serra, São Sebastião Moreira, Sertanópolis e Ventania.
A última grande novidade em relação ao recebimento do dinheiro ocorreu em 5 de fevereiro de 2019. Nesta data, em uma assembleia geral, realizada em Londrina, os agricultores credores da Seara participaram da aprovação de um Plano de Recuperação Judicial (PRJ). Na ocasião ficou acertado que a companhia buscaria no mercado um empréstimo para o pagamento dos 1,1 mil produtores. O mesmo acordo também previa que, caso não houvesse sucesso na obtenção do empréstimo, seriam transferidos aos produtores bens pertencentes à empresa para honrar a dívida.
O advogado Bruno Pirog Stasiak, da A. Santos Advogados, que representa a Seara Agroindustrial, explica que não foi possível obter o empréstimo. Por isso, o processo passou para as próximas etapas do PRJ, que envolvem desembaraçar os bens a serem transferidos aos produtores, como caminhões, imóveis, propriedades rurais e terminais de carga. “Nesse período, o que acabou demorando mais do que prevíamos inicialmente foi o processo de desonerar os bens, o que conseguimos concluir na primeira semana de maio”, revela.
Ainda segundo Stasiak, a demora ocorreu, principalmente, porque várias pessoas físicas e jurídicas estão cobrando dívidas da empresa. Além disso, o processo de recuperação judicial, regulado pela Lei 11.101 de 2005, tem uma ordem de pagamento a seguir. Assim, quando um juiz trabalhista (onde tramitam ações dos credores de Classe I) faz uma penhora em uma ação movida por ex-funcionários, por exemplo, todo o processo é paralisado.
“Tivemos que ultrapassar todas essas situações trabalhistas. Foi necessário até mesmo ir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para conseguirmos que a juíza de Sertanópolis tivesse garantida a competência para deliberar sobre os bens da recuperação constantes no plano aprovado em 2019 pelos produtores”, detalha o advogado da Seara.
Próximos passos
Com a desoneração dos bens, segundo Stasiak, agora vai ocorrer a abertura de um edital para leilão dos bens destinados a pagar a dívida com os produtores rurais. O dinheiro arrecadado, além dos bens que não forem arrematados em leilão, serão transferidos para uma empresa criada para ser gerida pelos agricultores, chamada Credores Estratégicos S.A. Esta vai receber os ativos e, em assembleia, os produtores vão decidir como será a divisão proporcional dos créditos. A previsão é que a transferência dos recursos e bens à essa empresa ocorra até o fim de julho, de acordo com o advogado da Seara. Vale lembrar que a Seara envolvida no processo de recuperação judicial não tem relação com a Seara Alimentos do grupo JBS.