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Sucuri no Rio Grande do Sul não é história de pescador

Repteis antes vistos mais no Pantanal são encontrados na Fronteira Oeste do Estado
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Publicado em 17/03/2024

Há mais de 20 anos, pescadores e peões de fazendas da costa do Rio Uruguai, principalmente na parte Sul, a partir dos municípios de Itaqui, São Borja, Uruguaiana e Barra do Quaraí, garantem ter visto cobras sucuris nos campos e rios da região. Mas os avistamentos das serpentes - comuns na região do Pantanal - não eram levados a sério e serviam até de motivo de brincadeiras. Ou consideradas histórias de pescador, que carregam a má fama de aumentarem seus feitos.


Animal foi encontrado a cerca de 100 metros das margens do Rio Uruguai, em São Borja
Animal foi encontrado a cerca de 100 metros das margens do Rio Uruguai, em São Borja

A situação permaneceu inalterada até que, em 2009, funcionários de uma granja flagraram uma sucuri-amarela (Eunectes notaeus) tentando matar um cachorro da raça Labrador, perto de um valo de uma lavoura de arroz, em Uruguaiana. Com uma pá, os peões conseguiram desvencilhar o cachorro do réptil. A Polícia Ambiental foi chamada, mas a sucuri já havia sumido e ficou o dito pelo não dito.
A confirmação veio só em setembro de 2010, quando policiais militares do 2º Batalhão Ambiental da Brigada Militar, por meio do 4º Pelotão de Uruguaiana, capturaram uma sucuri em uma granja no município. O animal, uma fêmea, media 3 metros e pesava 35 quilos. Na época, a serpente foi levada para o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para destinação adequada, já que a espécie não é nativa do Rio Grande do Sul.

Nesses mais de 14 anos, o encontro com essas serpentes passou a ser mais comum, tanto que alguns especialistas já a consideram como uma espécie nativa do Estado. No dia 13 de fevereiro, um macho resgatado a cerca de 100 metros das margens do Rio Uruguai, em São Borja, na Fronteira Oeste, foi levado até Porto Alegre por uma equipe do Ibama antes de ser encaminhada para o Instituto Hospitalar Veterinário (IHVET) da Universidade de Caxias do Sul (UCS), na Serra Gaúcha. para realizar uma tomografia computadorizada antes de ser devolvida à natureza.
O animal, de 2 metros de comprimento e quase oito quilos, está sob cuidados do Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas), e o exame faz parte de um estudo de reconhecimento da espécie sucuri-amarela cujo objetivo é consolidá-la como um animal da fauna nativa do Rio Grande do Sul.

“Solicitamos à Polícia Ambiental que o animal não fosse solto de imediato pelo interesse em analisá-lo, porque já há histórico de aparecimento dessa espécie na costa do Rio Uruguai, principalmente na parte Sul, a partir de Itaqui, São Borja, Uruguaiana e Barra do Quaraí”, do Rio Grande do Sul, ao contrário do que muita gente pensa”, relata o analista ambiental do Ibama, Paulo Guilherme Carniel Wagner. “Estamos procedendo com esse estudo, porque a frequência dos relatos nos faz crer que se trata, sim, de um animal da fauna nativa”, acrescenta.


Ocorrência

A sucuri-amarela tem ocorrência, como área núcleo, no Pantanal, mas também ocorre no Paraguai e na Argentina, principalmente descendo pela Bacia do Prata, do qual o Rio Uruguai faz parte. Historicamente, moradores da costa do Rio Uruguai sempre relataram a presença desses animais, mas isso foi, por muito tempo, declinado como folclore por uma ala de pesquisadores. “Infelizmente. Se perguntar para qualquer pessoa que mora na costa do Rio Uruguai, pescadores, por exemplo, eles vão dizer que sempre teve sucuri por lá. Ela é nativa do Rio Grande do Sul, toda a população moradora da costa do Rio Uruguai, há décadas atesta a presença do animal”, garante o chefe do Cetas.

O veterinário lembra que o herpetólogo, pesquisador e professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RS), Thales de Lema (falecido em 2020), já havia realizado pesquisas com répteis naquela região, mas que o estudo se limitou à análise física dos animais, sem nenhum material biológico e genético, e os animais nem foram marcados quando devolvidos à natureza. “As cobras continuaram surgindo por lá, inclusive temos relatos de pessoas que as matavam para tirar o couro. Hoje estamos retomando esses estudos para comprovar que a Sucuri Amarela também pertence à fauna nativa gaúcha”, afirma Wagner.




Como foi o exame

O exame mobilizou uma equipe de médicos veterinários, enfermeiros e assistentes por cerca de uma hora e meia. Assim que chegou ao IHVET, a cobra foi levada a um ambiente aquecido, onde permaneceu por alguns minutos. “A elevação da temperatura corporal é fundamental para que os anestésicos necessários para o exame façam efeito”, explica a médica veterinária e professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS) Claudia Giordani, que realizou a tomografia. Em seguida, o animal foi anestesiado e acomodado sobre a maca do tomógrafo.

As imagens computadorizadas foram registradas em três etapas, cada uma exigindo o reposicionamento do réptil – e uma dedicação atenciosa da equipe. Depois de uma hora o procedimento estava concluído, e após mais duas horas a cobra estava acordada e ativa. Na metade da tarde, a sucuri recebeu “alta” e foi encaminhada ao Cetas. O resultado do exame fica pronto em até quatro dias úteis, mas preliminarmente tudo indica que ela voltará à natureza na próxima semana, no mesmo local onde foi resgatada.

A tomografia feita no IHVET faz parte de uma bateria de exames pelos quais a cobra está passando, a maioria deles realizada no próprio Cetas, onde já foi coletado material biológico e genético e concluída a parte epidemiológica. “A tomografia computadorizada é importante porque nos ajuda a conhecer a sistemática do animal e sua anatomia graças à qualidade das imagens, fundamental para a identificação da espécie”, destaca o médico veterinário Paulo Guilherme Carniel Wagner, analista ambiental do Ibama e chefe do Cetas-RS.

Já referência como complexo hospitalar veterinário no Rio Grande do Sul, o IHVET foi escolhido pelo Ibama para realização do exame por ser um hospital-escola de uma Universidade Comunitária e devido a sua estrutura, equipe e proximidade de Porto Alegre.

“A UCS é nossa parceira, e gentilmente se colocou à disposição para proceder esse exame. Uma parceria muito importante, que nos faz ter uma análise de alta qualidade, de tecnologia, para fornecer informações desse animal e de futuras espécies”, observa Wagner.




Animal foi encontrado a cerca de 100 metros das margens do Rio Uruguai, em São Borja

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