O estudo foi realizado em oito áreas nos municípios paraenses de Barcarena e Abaetetuba. Foram analisadas quatro áreas manejadas de açaí de várzea e outras quatro de plantios em terra firme.
O estudo foi realizado em oito áreas nos municípios paraenses de Barcarena e Abaetetuba. Foram analisadas quatro áreas manejadas de açaí de várzea e outras quatro de plantios em terra firme. Nos locais, foram coletados insetos de 74 espécies diferentes que visitaram as flores da palmeira.
Autora principal do artigo, a agrônoma da UFRA Leilane Bezerra conta que ao estudar o número de grãos de pólen de açaí transportados pelos insetos, a equipe descobriu que as abelhas nativas são o grupo de polinizadores mais eficaz.
Oito vezes mais pólen
De acordo com a bióloga Márcia Maués, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental (PA), coautora do trabalho, até agora cientistas sabiam pouco sobre o percentual das contribuições dos diferentes grupos de insetos à polinização do açaí. Esse conhecimento, segundo ela, é fundamental para embasar recomendações aos agricultores sobre a polinização e manejo de polinizadores dessa palmeira tão importante para a economia do Pará e do Brasil.
Visitantes floraisA pesquisa analisou todos os visitantes da palmeira durante a fase feminina, cujo período é de quatro a oito dias, no período de maior floração da palmeira, entre março e junho. Isso, segundo Maués, serviu para facilitar a identificação dos potenciais polinizadores, “pois apenas os insetos que transferem pólen para as flores femininas podem polinizar”, detalha.
A etapa seguinte foi quantificar os grãos de pólen presentes no corpo de cada inseto, o que a pesquisa chama de carga polínica. Essa atividade revelou a média de dois grãos por animal, pois em 25% deles não foi detectado pólen. “Porém, encontramos abelhas solitárias que carregavam até cinco mil grãos de pólen em seu corpo. Era como se tivesse mergulhada em farinha”, compara o biólogo Alistair Campbell, pesquisador visitante em atuação na Embrapa Amazônia Oriental.
As mais eficientesO estudo comprovou que as abelhas nativas representam mais de 90% da polinização do açaí, e entre elas estão as sem ferrão (60%) e as solitárias (35%). Das quatro espécies nativas que se destacaram na carga polínica e abundância nas flores, duas são abelhas solitárias dos gêneros Augochloropsis e Dialictus; e outras duas espécies sem ferrão do gênero Trigona, a arapuá (Trigona branneri Cockerell) e a olho-de-vidro (Trigona pallens Fabricius).
Nada substitui a floresta
Campbell explica ainda que há pouco conhecimento sobre o manejo das abelhas solitárias e que muitas delas constroem seus ninhos no chão. No caso das abelhas Trigona, o manejo também não é fácil, pois, apesar de não terem ferrão, são agressivas e exigem mais cuidado. No entanto, existem outros meliponíneos que podem ser manejados. O cientista afirma que manter a floresta ao redor de plantios, contribuindo para a polinização natural, ainda é a melhor opção ao produtor.
Inserir colmeias em áreas de açaí plantado em terra firme e em áreas manejadas de várzea é uma estratégia para aumentar a produção de frutos, especialmente quando há desmatamento no entorno, segundo Campbell. Porém, nada substitui a preservação da floresta na manutenção da biodiversidade. “A gente nunca vai conseguir reproduzir o esforço da floresta”, afirma o cientista.
“Os resultados mostram que a produção de açaí depende de um conjunto diverso de abelhas para obter altas colheitas. Algumas delas podem ser manejadas em colmeias. Mas é importante que os produtores mantenham florestas preservadas perto das áreas de produção para promover polinizadores silvestres e a alta produção de frutos”, reforça o biólogo Cristiano Menezes, da Embrapa Meio Ambiente, coautor do trabalho.
Ele diz ainda que os produtores podem investir em polinizadores manejados, mas isso envolve custos de compra de colmeias e manutenção de colônias. “Ainda assim os polinizadores silvestres presentes na floresta são mais eficientes. É melhor ter áreas menores de açaí cercadas por florestas que produzem mais frutos por touceira do que plantações maiores que produzem muito menos”, conclui Menezes.
Serviço de alto valor
Os autores reforçam a necessidade de mais pesquisas sobre a polinização do açaí para transformar essas descobertas em práticas agrícolas que protejam a biodiversidade e o bem-estar humano. “O valor total da polinização animal para a agricultura brasileira é estimado em R$ 43 bilhões por ano. E nos trópicos, 90% das plantas com flores dependem, pelo menos parcialmente, de polinizadores para produzir seus frutos e sementes”, afirma Maués.
Para chegar ao estudo recente, a equipe de pesquisadores vem trabalhando desde 2016. Maués conta que são nove projetos que estudam as abelhas e polinização, financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) em parceria com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama), Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e Associação Brasileira de Estudos das Abelhas (Abelha).
“Trata-se do primeiro edital do CNPq com aporte de parcerias público-privadas. Entre os objetivos do projeto está o estudo do papel das abelhas na polinização de diferentes espécies frutíferas e arbóreas e o impacto na produtividade de plantios e de áreas manejadas”, conta Maués, coordenadora do trabalho.