Por Rodrigo Provazzi*
A confiança é de extrema importância no mundo corporativo, e não poderia ser diferente no agronegócio, um dos motores da economia brasileira. Entretanto, pode-se afirmar que, nos tempos atuais, esta qualidade se tornou ainda mais necessária. Com o crescimento da prática de terceirização no campo, uma série de fatores precisam ser devidamente observados para que a cadeia produtiva funcione, mas, acima de tudo, algo essencial não seja descuidado: as pessoas.
A polêmica em torno das acusações de violação aos direitos humanos e de condições precárias de trabalho que vieram à tona na mídia tiveram impacto na confiança das empresas perante o público. Independente da apuração sobre a responsabilidade, a percepção do fato recaiu não apenas sobre as envolvidas, mas a toda a região a qual pertencem, o que é prejudicial tanto para o mercado quanto para a sociedade. Crises como estas fazem com que marcas construídas por décadas fiquem suscetíveis a, em pouco tempo, terem sua reputação drasticamente manchada.
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Tudo isso evidencia a necessidade da adoção de práticas de Compliance, capazes de estabelecer processos e fortalecer a autovigilância por parte de empresas do agro, principalmente aquelas que, em decorrência da sua operação, precisam recorrer ao outsourcing. Medidas como verificação regular do cumprimento das leis, monitoramento das condições de trabalho, implementação de contratos claros, criação de canais de denúncia e realização de auditorias independentes são ferramentas que este sistema de governança pode oferecer de forma a se antecipar a problemas e evitar danos à integridade da empresa.
A reputação é fruto do cumprimento de promessas feitas ao público, dando sustentação e referendando o negócio. Em decorrência, a confiança existe apenas quando há transparência entre as promessas feitas e as pessoas a quem se prometeu. Quebrar este elo é perigoso e, às vezes, incontornável. Em épocas de redes sociais, aliás, o cuidado deve ser redobrado, uma vez que informações se espalham à velocidade da luz, formando opinião popular muito rapidamente – não raro, negativa.
Os recentes acontecimentos deixaram claro que a sociedade entende que a responsabilidade por adotar condições dignas de trabalho e o devido cumprimento das leis trabalhistas não cabe apenas às terceirizadas, mas também às contratantes. Programas de Compliance ajudam a sistematizar processos como a realização regular fiscalização e de auditorias, que evitariam, de antemão, erros inadmissíveis como pagamento incorreto de salários e horas extras, não concessão de férias remuneradas, condições inadequadas de trabalho, entre outros.
Há avanços neste sentido. Na esfera pública, circula no Congresso Nacional o Projeto de Lei 572/2022, que estabelece o marco nacional dos Direitos Humanos e Empresas com vistas a uma maior fiscalização e transparência de todos os aspectos da cadeia produtiva, incluindo a responsabilização de possíveis infrações aos direitos dos trabalhadores cometidos.
Igualmente, existem casos de produtores de maçã gaúchos cujas práticas de Compliance vêm provando sua eficiência. Além da atenção às questões trabalhistas e sanitárias básicas, desde o início dos anos 2000 estas empresas instituíram melhorias como alojamentos-modelo e acesso livre à rede Wi-Fi para os trabalhadores sazonais, visando, principalmente, contato com suas famílias em outras regiões do Brasil.
O Compliance para empresas do agronegócio, neste cenário, tem as ferramentas ideais para uma ação sistêmica e preventiva que abarca tanto o operacional quanto o humano. Afora o principal aspecto, o respeito às pessoas, é fundamental a atenção a possíveis contratos de terceirização de modo que práticas indevidas sejam cometidas e, por consequência, tanto a reputação quanto a confiança das marcas sejam afetadas.
*Rodrigo Provazzi é Sócio da PwC Brasil