Feijões amazônicos se destacam por alto valor nutricional e diversidade
Feijões se destacam por alto valor nutricional e diversidade, promovendo renda e preservação da agricultura familiar
Feijões do Juruá unem sabor, diversidade e alto valor nutricional. Foto: Felipe Sá
Um estudo inédito no Vale do Juruá, no Acre, mostrou que os feijões-caupi Costela de Vaca e Manteiguinha Branco possuem até 27% de proteína. Esse valor supera a média de 20% de outras regiões e ultrapassa a média mundial. A pesquisa integra a tese de doutorado “Qualidade nutricional e armazenamento de feijões do Juruá no Acre”, conduzida pela professora do Instituto Federal do Acre (Ifac), Guiomar Almeida Sousa, com orientação do pesquisador da Embrapa Acre, Amauri Siviero.
As análises ocorreram no laboratório de Bromatologia da Embrapa Acre. Os agricultores familiares cultivam as variedades mais proteicas usando métodos tradicionais. A maior parte do plantio ocorre no período seco, nas praias dos rios da região.
Antocianinas e benefícios à saúde
Além disso, o estudo identificou antocianinas, antioxidantes naturais que ajudam a combater o envelhecimento celular e prevenir doenças como câncer, problemas cardíacos e Alzheimer. Os feijões Preto de Arranque e Preto de Praia se destacaram, com índices de 420 a 962 microgramas por grama, acima dos encontrados em variedades brancas e coloridas.
Segundo a professora Guiomar, a composição nutricional varia conforme a espécie, a variedade e o local de cultivo. “Essas variedades ainda são pouco estudadas, o que mostra que ainda temos muito a aprender sobre elas”, afirma.
Valorização e conservação do produto
O conhecimento nutricional pode valorizar o produto e gerar mais renda para os produtores. O estudo também comprovou que os grãos mantêm suas qualidades por até 12 meses em diferentes tipos de embalagens. Siviero explica: “Esse ponto é fundamental, pois as sementes são selecionadas e manejadas por agricultores familiares, indígenas, quilombolas e outros povos tradicionais. Ao longo dos anos, elas se adaptaram às técnicas de manejo e às condições locais de cultivo.”
Conhecer essas características também permite desenvolver mercados selecionados, nos quais consumidores pagam mais por feijões diferenciados. Assim, o produto se valoriza e aumenta a renda dos agricultores.
Políticas públicas e certificações
O Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) lançou em setembro o Selo Povos e Comunidades Tradicionais do Brasil, que reconhece alimentos e produtos de comunidades tradicionais. Por isso, associações e cooperativas podem solicitar o selo para os feijões crioulos do Juruá.
Além disso, os feijões podem receber certificações orgânicas ou Indicação Geográfica, como já ocorreu com a farinha de mandioca da região. A cadeia produtiva envolve agricultores, cooperativas e instituições públicas e privadas. A embalagem a vácuo também ajuda a conservar os grãos, evitando o uso de inseticidas.
Sustentabilidade e agricultura familiar
O Vale do Juruá é conhecido pela diversidade agrícola e pelas práticas sustentáveis. A pesquisadora Elisa Wandelli, da Embrapa Amazônia Ocidental, reforça que os ribeirinhos conseguem produzir alimentos enquanto preservam a natureza. “Nas comunidades que visitamos, vimos uma população sábia que mostra ser possível produzir alimento e cuidar da natureza ao mesmo tempo. Essa sabedoria ancestral merece ser protegida e valorizada”, afirma.
Pedro Bezerra da Silva, agricultor da Comunidade Novo Horizonte, em Porto Walter (AC), planta macaxeira, banana e feijão todos os anos. “Grande parte da alimentação da família vem do que plantamos. O que sobra vendemos para aumentar a renda. Se eu não plantar, não consigo comprar todos os alimentos na cidade”, conta.
Ele também percebe mudanças no clima. “Nos últimos anos, o verão tem ficado cada vez mais quente. Já tivemos anos em que tudo secou, até brotos de água na mata”, complementa.




