A queda na oferta de contêineres refrigerados intensificada nas últimas três semanas pela pandemia, pelo câmbio e pelo encalhe do Ever Given fez o preço de frutas, verduras e legumes brasileiros disparar na Europa, aponta uma aplicação de Big Data adotada recentemente pela Rangel Logística.
A falta de compartimentos frigorificados essenciais para ampliar a vida útil de perecíveis e a gestão do preço de venda multiplicou por até cinco vezes o valor do frete marítimo entre o Brasil e o Velho Continente. Na gôndola, o impacto é de um aumento de até duas vezes no preço de gêneros como uva, manga e mamão nos supermercados da Espanha, com forte pressão sobre as margens de exportadores brasileiros e varejistas europeus.
A situação tem afetado inclusive os exportadores de frutas e legumes da Europa, que abastecem o Brasil num fluxo de safra e contrassafra, responsável por assegurar o acesso de alimentos nos quais nenhuma das regiões é autossuficiente. Se de um lado o aumento no custo logístico limitou a competitividade do produto brasileiro, por outro, a desvalorização recorde do real perante o euro está perto de inviabilizar alimentos da Europa por aqui.
O diagnóstico foi feito por um sistema que a Rangel adotou como ferramenta de tomada de decisão para clientes que compram perecíveis de diferentes países. "Identificamos uma situação realmente atípica", diz Enrique Garcia, diretor de desenvolvimento de negócios, que atua na rota Brasil-Europa há décadas. "E tivemos a oportunidade de avisar nossos clientes antes para reverem suas programações".
O executivo explica que a falta do equipamento e a consequente alta no preço foi ocasionada pela combinação de fatores inéditos, como vacinação desigual no mundo, desvalorização recorde do real e o recente fechamento do Canal de Suez. A disparidade da imunização contra covid no mundo produziu um cenário em que países com vacinação adiantada, como Estados Unidos, China e Europa, já vislumbrem a retomada total da produção e da demanda. Na via oposta, as economias exportadoras que ainda enfrentam limitações na atividade econômica por causa das baixas taxas de cobertura vacinal, que é o caso do Brasil, não têm conseguido atender a demanda.
Como resultado, compradores do Hemisfério Norte passaram a adquirir perecíveis de vários países, pulverizando os contêineres frios disponíveis em várias rotas. Além disso, a demanda em alta por proteína na China tem absorvido um número cada vez maior de contêineres, restringindo a oferta do equipamento para outros transportes. "A tempestade perfeita chegou com o encalhe do Ever Given no Canal de Suez, que afetou a programação de chegada e saída de contêineres frigorificados no mundo todo. Mais de um mês depois do episódio, o fluxo ainda não se normalizou por completo", relata Garcia.
A falta de contêineres frios fez operadores logísticos buscarem alternativas para garantir o acesso ao equipamento. A Rangel reservou os contêineres que encontrou na Europa, passando a transportar neles carga seca para o Brasil com a refrigeração desligada. A empresa também fechou acordos com empresas de navegação para garantir o uso deles na volta para a Europa, evitando que fossem absorvidos no embarque de carnes do Brasil, que movimenta 12 vezes mais volumes em relação ao de frutas.
Garcia também já antecipou reservas de contêineres para as safras de uva na Itália, de cebola no Mediterrâneo e de kiwi na Nova Zelândia. "Vamos garantir que os produtos cheguem ao Brasil em boas condições", diz.